Dever

1. De forma genérica, entende-se por dever uma limitação à liberdade de ação da pessoa numa situação concreta da vida em que lhe é imposto adotar um de entre vários cursos de ação alternativos que pode prosseguir. A limitação à liberdade é assumida pelo agente, quer dizer, este condiciona-se a agir conforme ao dever, mesmo sabendo que está à sua disposição seguir um curso de ação diferente, pois se a imposição do comportamento ocorresse sem consideração da sua vontade teria lugar a supressão da sua liberdade, logo o comportamento do agente não chegaria a ser devido.

Tomando como base esta aproximação geral ao conceito de dever, vamos distinguir um sentido de dever moral (sentido amplo que inclui o jurídico) de um sentido não moral; ponderaremos a articulação entre dever e ser; questionaremos a delimitação entre expressões de existir e expressões de dever; finalmente, articularemos o dever (ser) com o existir (ser). Este percurso encontrará fundamentalmente apoio no pensamento do dever que colhemos em Hume e Kant, em Hume por ter dado origem a um questionamento do dever ainda hoje não encerrado, e em Kant por nos ter legado a grande síntese do pensamento alemão da Idade Moderna sobre o dever, pensamento onde este conceito terá encontrado o seu mais alto nível especulativo (Sosoe 2001: 430).

2. O conceito de dever pode ser tomado em dois sentidos diversos conforme o enquadremos em juízos morais ou em juízos de racionalidade, em tais termos que os primeiros enunciam exigências e são incondicionais, ao passo que os segundos enunciam recomendações e são condicionais (Schulte 2012). Hume é representativo do segundo entendimento pois na sua contraposição entre ser e dever, faz corresponder a primeira expressão ao exercício da razão onde se pode predicar verdade ou falsidade, e a segunda a um particular estado emocional do falante, um dado empírico e psicológico (sentimento de prazer ou de desprazer) a equacionar em termos de utilidade (Hume 1969: 547, 551; Sosoe 2001: 435). Kant não descarta este entendimento psicológico e utilitarista do dever como um dos seus possíveis sentidos. Temos, assim, o dever reportado a comportamentos técnico-práticos onde não se equaciona a questão da liberdade moral, nos mantemos ainda e apenas no campo do fenoménico, no domínio da natureza, onde se pode identificar, se se quiser, um entendimento psicológico de liberdade (Kant 1986: 112; AA 05: 96). Aqui dever pressupõe que o homem pode (categoria modal teórica) causar (categoria da relação teórica) algo na natureza, quer dizer, o homem é fenomenalmente ativo. A determinação do sentido concreto da ação por dever decorre de imperativos hipotéticos, quer dizer, da necessitação da eleição pelo agente da alternativa de entre as possíveis que é mais vantajosa, mais adequada, mais recomendável, enfim, mais útil, para a concretização dos seus fins subjetivos. Consideremos, a título de exemplo, a seguinte expressão: “Para ires para o Porto deves fazer a viagem no Alfa Pendular”. A expressão aponta um comportamento (viajar no Alfa Pendular); subentende alternativas ao comportamento enunciado (escolher outro meio de transporte); e subentende um fundamento da opção que destaca como sendo a adequada, fundamento encapsulado na expressão deves, e que corresponde, por hipótese, ao fim de minimizar o tempo de viagem ou de maximizar o conforto da mesma: “Para ires para o Porto, deves fazer a viagem no Alfa Pendular (deves porque é o meio de transporte mais rápido e mais cómodo)”.

Porém, sem descartar este entendimento psicológico e utilitarista do dever como um dos seus possíveis sentidos, Kant centra fundamentalmente a sua atenção num entendimento reportado a valores morais, o sentido moral-prático de dever. Contraste-se o exemplo anterior com este outro: “para ires para o Porto deves pagar a viagem no Alfa Pendular ao transportador”. Também aqui nos é apontado um comportamento (adquirir um título de transporte para uma viajem no Alfa Pendular) e se subentendem alternativas ao comportamento enunciado (viajar sem pagar o título de transporte). Onde este exemplo se distingue do anterior é no fundamento da opção que destaca como sendo a adequada, no fundamento do deves. Se esse fundamento estivesse num fim atinente a vantagens puramente subjetivas a opção a selecionar seria a oposta, a de não pagar o título de transporte para, digamos, o viajante evitar a correspondente perda financeira: “para ires para o Porto não deves pagar a viagem no Alfa Pendular ao transportador (não deves porque assim conservas as tuas disponibilidades financeiras)”.

O que explica então um dever contrário ao interesse subjetivo do agente? Considerações de outra natureza, não técnico-práticas, antes moral-práticas. O ponto de partida é a consideração de que o homem não é apenas um ser do domínio da natureza, apenas sujeito às normas a que esta obedece (logo, suscetível de cumprir com deveres técnico-práticos), ele é também moralmente livre e capaz, não só de escolher entre um de vários cursos de ação preordenados como possíveis, mas ainda de fixar ele próprio o espectro de possibilidades dentro do qual se configura a sua ação. Pode fazê-lo porque integra o reino dos fins, quer dizer, faz parte de uma sociedade de seres livres onde se concilia a liberdade de cada um com a liberdade dos demais num percurso individual de progressivo aperfeiçoamento próprio e prossecução da felicidade alheia (Kant 2005: 291; AA 06: 385).

Deste ponto de vista o agente moral encontra-se, pois, situado num duplo plano, natural e moral, e ambos os planos se entrelaçam. A questão que aqui se coloca é a de como conceber a verificação de um estado de coisas no mundo da natureza que não impacte indiretamente de forma negativa na construção do mundo moral (o reino dos fins), tendo presente que há, por um lado, campos do domínio da natureza sem importe moral e onde apenas há a fazer juízos teóricos, e, por outro lado, campos do domínio da liberdade sem importe naturalista, onde só há lugar a juízos estritamente morais. No vasto campo onde mundo da natureza e mundo dos fins coexistem e interagem deparamo-nos com a exigência de juízos moral-práticos, juízos onde convergem considerações teóricas e considerações morais. Aqui o dever reconfigura-se como a exigência de sobrepor à orientação para a ação fornecida pelo juízo técnico-prático uma orientação decorrente de considerações morais. De facto, o dever orientado para fins egoístas (fins concebidos em função da utilidade subjetiva da ação) frequentemente ignora os fins morais (conciliação da liberdade dos sujeitos do reino dos fins, aperfeiçoamento pessoal, felicidade alheia). Pelo contrário, o dever orientado por fins morais impõe a desconsideração dos fins egoístas. Voltando ao exemplo, o ditame moral impõe, em primeiro lugar, a consideração do impacto que o não pagamento do bilhete tem no prestadorde serviços de transportes e, em segundo lugar, a atenção ao interesse difuso da sociedade de agentes morais no equilíbrio das relações que se estabelecem entre prestadores de serviços de transporte e passageiros. Para o agente concreto, a identificação do que lhe é exigido como conforme ao dever resulta assim de dois processos concorrentes de reflexão sobre o condicionamento da sua vontade.

Por um lado, a conciliação da liberdade dos membros do reino dos fins leva-os a estabelecer normas de comportamento para as diversas situações da sua vida em comum. Quer dizer, identificam as situações da sua interação no domínio da natureza onde o comportamento de cada um interfere com a liberdade dos demais; verificam qual o comportamento, de entre os cursos de ação possíveis nessas situações, que melhor concilia a esfera de liberdade dos envolvidos; e conformam esse comportamento como o devido. Quer dizer, os integrantes do reino dos fins estabelecem normas externas que indicam quais as ações a realizar nas situações de vida concretas. Para os agentes que se vêm envolvidos nessas situações de vida, o critério de decisão da ação, o critério de definição do que é devido, surge, numa primeira análise, como um critério externo, imposto de fora pelo todo social, sem consideração dos fins subjetivos que o agente pode em concreto configurar, dado que lhes sobrepõe o fim mais vasto da conciliação da liberdade do agente com a liberdade dos demais. Assim configurado o dever, ao agente apenas se exige que atenda à legalidade da sua ação, quer dizer, à sua conformidade com a norma que estabelece em geral a alternativa de comportamento a eleger em concreto. No nosso exemplo, o dever moral-prático diz ao agente que “para ires para o Porto deves pagar a viagem no Alfa Pendular ao transportador”, onde o transportador é outra pessoa integrante do reino dos fins.

Este primeiro condicionamento moral do agente, este condicionamento jurídico, não é isento de problemas. Uma vez que o próprio conceito de dever incorpora a possibilidade de o agente não agir conforme ao que é devido e como o que é devido pode entrar em colisão com os fins subjetivos do agente, é preciso introduzir-se um mecanismo de necessitação subjetiva, quer dizer, um mecanismo que tenha como efeito levar o agente a agir em concreto de acordo com o tipo de ação devido em geral, mesmo que isso contrarie os seus fins subjetivos. Tal mecanismo de necessitação subjetiva é a possibilidade de coação, a coercibilidade associada ao dever: “Para ires para o Porto deves pagar a viagem no Alfa Pendular ao transportador (deves porque serás punido se não pagares)”. Dado que o comportamento contrário ao dever (viajar sem ter adquirido título de transporte válido) alarga indevidamente a liberdade própria em prejuízo da liberdade alheia (em concreto configurada como um direito do transportador recíproco do dever do agente), a coação visa repor o equilíbrio dessa maneira perdido. No entanto, mais do que a coação (que opera com total desconsideração da vontade do agente), o que carateriza o dever é a coercibilidade (que incide sobre a formação da vontade do agente no sentido de o levar a adotar por si mesmo o comportamento devido). A legalidade não se traduz numa mera imposição pela força de um comportamento ao agente, pois tal imposição pela força negaria ao agente a sua liberdade, logo, negaria ao agente a sua agência, torná-lo-ia em coisa, destitui-lo-ia de humanidade, exclui-lo-ia o do reino dos fins. Antes, o que está aqui em causa é impor-se ao agente um fim objetivo (o produto da ação devida encarado como de produção necessária, seja pela via da ação do agente conforme ao dever, seja pela via da sua imposição coativa) que se sobreponha aos seus fins subjetivos (utilitários ou outros). No exemplo, a norma que funda o dever melhor se exprimiria assim: “Para ires para o Porto deves pagar a viagem no Alfa Pendular ao transportador, por tua própria iniciativa ou por coação”. É certo que, como observou Fichte logo no final do século XVIII e tem sido reiteradamente apontado desde então, assim concebida, a imperatividade do dever aparenta ser uma imperatividade hipotética, estaremos aqui ainda no campo do técnico-prático. Porém, não é esse o entendimento de Kant. O dever jurídico assenta na liberdade individual, único direito inato (Kant 2005: 56; AA 06: 237-238), e na sua conciliação com a liberdade dos outros. Sendo assim, o dever concreto resulta de uma norma livremente assumida pelo agente como sua, na medida em que ele se integra livremente na sociedade civil (o reino dos fins visto pelo ângulo jurídico a que hoje chamamos Estado de Direito), logo admite o condicionamento da sua liberdade pela liberdade alheira. Assim configurado, o dever é externo porque não é originado pelo agente, é categórico porque se impõe sem consideração dos fins subjetivos do agente e é estrito ou perfeito pois confere necessidade ao produto do comportamento (mera atividade ou resultado), seja pela via do fazer voluntário do agente, seja pela via do mecanismo de correção coerciva desse fazer caso o agente não se comporte conforme ao dever.

Diversa é a colocação da questão em termos éticos. Neste caso, o que está em causa é o posicionamento subjetivo do agente relativamente às máximas que considera deverem reger a sua ação, ou seja, os princípios ou normas pessoais, subjetivos, pelos quais entende determinar o seu comportamento. Deste ponto de vista a questão que se coloca ao agente não se prende com a ação (“devo pagar ou não pagar este bilhete em concreto?”), nem se prende com a justificação para esta ação (“devo atender ao meu interesse subjetivo? atender ao interesse da outra parte? atender ao interesse do todo social?”), prende-se antes com a reflexão sobre o critério de decisão do conteúdo daquele tipo de deveres (“em geral, deve pagar-se todo e qualquer bilhete?”). Aqui o dever não está em agir conforme ao critério de decisão da ação (a máxima ou norma), antes está na ponderação de tal critério de decisão eticamente fundamentada. Na formulação do juízo ético concorrem duas exigências, a primeira consiste na necessidade de aferição da estrita universalidade do juízo moral (o juízo ético tem em vista a definição de um critério válido para todos os casos sem exceção), a segunda em ter como fim em vista o aperfeiçoamento próprio ou a felicidade alheia, os únicos fins em cuja prossecução se podem fundar deveres universalizáveis.

Sucede que, como as máximas são pessoais, internas, subjetivas, e como a concretização do juízo ético é estritamente individual, o exercício do ajuizamento ético é a expressão por excelência da personalidade e é também a manifestação por excelência da autonomia e da liberdade em ato. Não se pode assim coagir a partir do exterior o agente a ajuizar eticamente, só ele se pode coagir a si mesmo a ajuizar eticamente as máximas das suas ações, o que pressupõe que se dê como fim a prossecução da perfeição própria e da felicidade alheia, universalmente em todas as suas ações. O que em cada caso concreto considerará ser seu dever é o que for conforme a um critério de decisão eticamente escrutinado e validado por si mesmo. No exemplo o agente ético poderia chegar à conclusão de que “quando para viajar (por exemplo, para o Porto) recorro aos serviços de um transportador (por exemplo, o que me põe à disposição o Alfa Pendular) devo comportar-me segundo a máxima de acordo com a qual «o viajante deve sempre pagar qualquer viagem ao respetivo transportador (deve porque assim contribui para a felicidade alheia)»”, onde ‘sempre’ e ‘qualquer’ exprimem a universalidade da máxima e a felicidade alheia é proposta como o fundamento material da máxima como dever.

3. Voltemos a Hume e à breve reflexão que inseriu no seu Tratado onde se manifesta perplexo com um comportamento discursivo (do seu ponto de vista frequente) em que o falante, na progressão do respetivo raciocínio, passa sem justificação de enunciados formados com base na cópula “é” ou “não é” (is, is not) para enunciados formados com base na cópula “deve” ou “não deve” (ought, ought not), sem justificar ou aduzir razões para tal mudança. Ora, diz-nos Hume, uns e outros enunciados são irredutíveis entre si, logo tal passagem vicia de maneira irremediável a linha argumentativa onde ocorre (Hume 1969: 521). Ao longo dos séculos esta breve reflexão cresceu e multiplicou-se em escritos de diversíssimos pensadores, no entanto carece de ser precisada.

É de observar que o dever nunca surge isolado, é sempre dever de algo, mais exatamente dever de uma ação, em si mesma (um fazer, simples atividade ou comportamento do agente) ou em função do seu produto (um resultado que se quer alcançar por via do comportamento do agente). Observa-se, pois, que o comportamento ou o produto inscrevem-se na ordem do ser e é esse ser que é devido, quer dizer, objeto de dever, daí falarmos com propriedade de dever ser (ser em geral ou uma dada concretização de ser, entidade ou estado expressa linguisticamente com um verbo adequado: dever estar, dever comer, dever andar, dever fazer, etc.). Por isso mesmo, em rigor o contraste não é entre ser e dever, antes é entre ser e dever ser.

Por outro lado, consideremos o seguinte exemplo: na Lógica que Jäsche preparou com base nas notas de Kant, é-nos dito que a lógica é uma ciência de regras com base no contraste entre um “uso necessário (apodítico) do entendimento” e um “uso contingente (assertórico) do entendimento” (Kant 2009: 6; AA 09: 14), duas expressões formalmente homogéneas – ambas se reportam a objetos da mesma natureza (o uso do entendimento) que sujeitam a modalizações formalmente paralelas (necessário versus contingente) e que se exprimem com a mesma sintaxe gramatical. Na sequência é-nos acrescentado que o uso necessário do entendimento nos diz “como o entendimento teve de proceder” no pensar, ao passo que o uso contingente do entendimento trata de “como o entendimento procedeu” no pensar (idem: 6-7; AA 09: 14). Neste caso deparamo-nos com expressões – teve de proceder e procedeu – heterogéneas: as sintaxes são diferentes, uma é modalizada e a outra não é, mas os objetos a que se reportam são os mesmos das expressões anteriores. Porquê esta diferença entre os dois pares de expressões?

Consideremos o seguinte: ao falarmos nem sempre explicitamos tudo o que temos a dizer, frequentemente contamos com a capacidade do destinatário para preencher o que deixamos apenas implícito. Assim sendo, no nosso exemplo podemos considerar que onde se diz, “como o entendimento procedeu”, não se diz tudo porque algo está aí subentendido, algo que, a ser explicitado, nos permite reinstalar o paralelismo com “como o entendimento teve de proceder”. Mais exatamente, podemos reformular a primeira destas expressões nos seguintes termos: “como o entendimento ocorreu proceder” (ou outra expressão adequada que possamos empregar em lugar de ocorreu, como aconteceu, sucedeu, etc.). Deste ponto de vista há um paralelismo entre ter de proceder que exprime necessidade e acontecer proceder que exprime contingência. Por outro lado, dizer “o entendimento teve de proceder de uma dada maneira” é o mesmo que dizer “o procedimento do entendimento teve de ser de uma dada maneira”; e dizer “o entendimento ocorreu proceder de uma dada maneira” é o mesmo que dizer “o procedimento do entendimento ocorreu ser de uma dada maneira”. Em suma, quando dizemos, “como o entendimento procedeu” o que estamos a fazer é omitir, deixando-a apenas implícita, a particular modalidade do ser que nos diz que o ser, na sua específica concretização num proceder, existe, ocorre, acontece, etc., omissão pragmaticamente justificável porque está aqui em causa a modalização de base do ser, a modalização por defeito, aquela que normalmente usamos e que, por isso mesmo, não explicitamos. Pelo contrário, quando queremos realizar outras modalizações, seja com os modais clássicos (necessidade, possibilidade, impossibilidade), seja com modais deônticos (dever ou obrigação, proibição, permissão), seja com outros modais que possamos identificar, vemo-nos quase sempre na necessidade de não deixar implícita a modalização, temos de a exprimir em letra de forma – em lugar de “como o entendimento teve de proceder”, podíamos ter “como o entendimento deve proceder”, por exemplo.

Em suma, o contraste entre ser e dever tem de ser reconsiderado em termos de um contraste entre dever ser e existir ser, onde o ser é o mesmo. Teoria e prática têm a mesma legitimidade para exprimir o ser, uma exprime-o como existente, a outra como devido. (Porquê existir ser e não ocorrer, haver, verificar, acontecer ser ou outra expressão equivalente? Porque Hume nos diz que existência é o que predicamos do ser (Hume 1969: 115) e porque Kant também recorre a existência em termos a que voltaremos na sequência.)

4. Como se diferenciam dever ser e existir ser? Acabámos de referir que Hume nos diz que existência é o que predicamos do ser, a que acrescenta que os únicos objetos contrários entre si são a existência e a não existência (Hume 1969: 223), isto quando procura delimitar o que podemos conhecer. Pelo seu lado, a virtude e o vício estão na origem do prazer e da dor (idem: 347), quer dizer, influenciam as paixões (ibidem: 509). Estas não são verdadeiras nem falsas (não se pode dizer que exprimem o que existe ou o que não existe), embora possam estar associadas a juízos que, esses sim, podem ser verdadeiros ou falsos (ibidem: 463), pelo que é apenas de maneira oblíqua ou mediata que uma ação pode causar ou ser causada por um juízo racional (ibidem: 510, 514). Quer dizer, as afirmações de existir ser estabelecem relações de semelhança, contrariedade, graus de qualidade e proporção (ibidem: 515) entre ideias de objetos externos, factuais, ao passo que as afirmações de dever ser exprimem um sentimento interno de aprovação ou desaprovação de uma ação (ibidem: 520). As afirmações de existir ser são assim suscetíveis de serem verdadeiras ou falsas, mas o mesmo não se pode dizer das afirmações de dever ser.

Este entendimento de que os enunciados de dever ser não são suscetíveis de verdade ou falsidade tornou-se quase um lugar-comum, o que levanta um problema quando se procura efetuar uma análise lógica de tais expressões pois as mesmas não serão assim suscetíveis de tratamento semântico. Aí, das duas, uma: ou se constrói uma linguagem lógica destituída de semântica ou ilude-se simplesmente a questão como ocorre com muitas lógicas deônticas que não se interrogam sobre a inconsistência de recorrerem a um aparato lógico num campo que supostamente cai fora do seu âmbito de aplicação (Weinberger 1998: 147, nota 3). Há, porém, uma outra possibilidade de dar tratamento lógico a expressões de dever ser que encontramos esboçada em Kant e que consiste em remeter as expressões deônticas, não para a sintaxe, mas para a semântica (para um tratamento desta questão, não na perspetiva do dever, mas antes na perspetiva da norma, cf. Mascarenhas 2017).

Qualquer juízo com que se pense o ser obedece a uma mesma forma expressa no quadro das formas do juízo, quadro válido para todos os juízos, quer teóricos, quer práticos. Ora, diz-nos Kant, as três primeiras rubricas (quantidade, qualidade e relação) dão-nos, por assim dizer, a forma interna do juízo, a forma do seu conteúdo, ao passo que a modalidade é-lhe externa, se assim nos podemos exprimir, dá forma, não ao juízo em si, não ao seu conteúdo, mas à sua relação com o pensamento em geral (Kant 1985: 107; B 99-100). Quer dizer, a modalidade estabelece a relação de um dado juízo com todos os outros juízos pensados ou a pensar. Se quisermos exprimir esta distinção com a linguagem da lógica contemporânea, o que observamos é que a quantidade, a qualidade e a relação correspondem à sintaxe que nos dá uma fórmula (judicativa) bem formada, ao passo que a modalidade atribui a tal fórmula bem formada um valor semântico. As formas da modalidade de Kant correspondem assim aos valores de verdade da lógica clássica, com a especificidade de que o filósofo de Conisberga desdobra o par verdadeiro-falso em três pares a que correspondem graus de certeza crescentes: hipotético – não hipotetizável; assertório – não asserível; apodítico – não apoditizável. (Se estamos no bom caminho, cada um dos três pares de valores modais pode ser operado logicamente em separado dos outros, cada um dando lugar a uma lógica bivalente que cumpre com todos os parâmetros da lógica clássica. No entanto, pode-se ainda formalizar o movimento do pensamento do primeiro para o segundo par ou do segundo para o terceiro par, construindo-se assim duas lógicas trivalentes com os seguintes valores de verdade: assertório – hipotético – não asserível; apodítico – assertório – não apoditizável.)

Acresce que as formas da modalidade exprimem a verdade formal dos juízos, a consistência lógica entre juízos bem formados pelo simples operar de uma correta discursividade sem consideração da matéria do seu conteúdo, verdade formal que nos permite aferir da correção formal de quaisquer inferências, teóricas ou práticas (Kant 1985: 94-95; B 85). Pela mesma ordem de razões, as formas internas, a sintaxe, são as mesmas em qualquer um dos domínios em que se exerce a discursividade e um juízo prático bem formado é bem formado nos mesmos termos em que o é um juízo teórico. No entanto, o juízo não é apenas forma, a esta associa uma matéria, e é esta diversidade material que demarca os juízos teóricos dos juízos práticos (num caso temos o ser encarado como ser natural, no outro o ser encarado como ser moral, livre). A unidade formal dá suporte a uma dualidade material que se especifica na diversidade de categorias, categorias teóricas e categorias práticas, que exprimem a especificidade do labor judicativo num e noutro domínio. Ora, é precisamente para a semântica prática (as modalidades práticas) que Kant reserva a expressão dever (que tomamos como expressão englobante no mesmos termos em que tomamos a expressão verdade para exprimir o complexo de formas modais antes apresentado) (Kant 1986: 81; AA 05: 66), expressão que encontra em existir o seu paralelo na semântica teórica (as modalidades teóricas) (Kant 1985: 104; B 95).

Deste ponto de vista, dever (ser) e existir (ser) são especificações em domínios materialmente diferenciados da verdade formal, num e noutro caso estamos perante termos semânticos: o dever, como o existir, não ocorrem na sintaxe, antes qualificam as expressões (juízos) bem formadas da sintaxe (bem formadas porque especificam uma dada quantidade, uma dada qualidade e uma dada relação). Estamos aqui longe das lógicas deônticas mais comuns onde os conceitos associados ao dever são sujeitos a um tratamento sintáxico (e o mesmo sucede, diga-se de passagem, com o conceito de existência, bem como com os conceitos modais comuns, aquele e estes reconduzidos por Kant à semântica e não à sintaxe). Temos, pois, que existir e dever exprimem paralelos valores de verdade para materializações diversas do ser: dizer que o ser é devido, tal como dizer que o ser existe, é dizer do ser que é verdadeiro, no primeiro caso verdadeiro no domínio da liberdade, no segundo caso verdadeiro no domínio da natureza, mas em qualquer dos casos formalmente verdadeiro nos mesmos exatos termos. Este paralelismo, desde cedo expresso por Kant (Kant 1997: 5) e que foi encontrando formulações alternativas à medida do amadurecimento do seu pensamento moral, tem eco noutros pensadores, por exemplo Fichte que nos disse que designamos de justa a ação que aprovamos, tal como designamos de verdadeiro o conhecimento que aprovamos (Fichte 1986: 161). Uma das vantagens desta abordagem é a de nos permitir construir lógicas para a moral ou o direito apenas com os recursos da lógica de predicados de primeira ordem (Lamego 2016: 212, 231; no mesmo sentido, cf. Gardies 1987: 92).

5. Cumpre agora ver como se articulam entre si existir ser e dever ser, o que nos leva, desde logo, à famosa observação de Hume sobre a deriva do ser para o dever que tanta tinta fez e faz correr (Hume 1969: 521). Se virmos bem, em Hume a passagem da expressão do existir ser à expressão do dever ser ocorre num debate onde oradores argumentam em torno de um ser (um dado estado de coisas ou um processo causal) sobre cuja existência não há consenso. Num tal contexto, a passagem por um orador da expressão do existir ser à expressão do dever ser tem o sentido retórico de procurar impor como consensual o ponto de vista do orador em causa, dando como argumentativamente indubitável o que está por assentar, como tendo de ser consensual no espaço discursivo. Quando, no decurso do debate, um orador afirma que “algo é” (que algo existe ser), apenas diz que esse algo é para si, orador que o diz ser, embora possa não ser para parte ou todos os demais intervenientes. Logo, aquilo de que um dado orador diz que é, é apenas possível do ponto de vista do conjunto de participantes no debate. Ao passar a exprimir-se em termos de dever ser, o orador dá como necessariamente existente o algo a que se reporta o debate, dá como necessário o consenso no espaço discursivo em torno desse ser. Se partirmos desta colocação da questão, então a passagem da possibilidade à necessidade do ser, expressa pelo orador com a expressão deve, não é algo que se possa ter por objetivamente fundado, antes deve ser tomada como uma particular disposição psicológica do falante, disposição que tão-somente revela a sua ligação emocional e preferência por um dado estado de coisas, estado de coisas que se mantém, apesar disso, apenas objetivamente possível (onde objetividade apenas significa intersubjetividade). A ser assim, o problema de Hume em nada nos esclarece quanto à articulação entre existir ser e dever ser porque nem sequer chega verdadeiramente a colocar em questão essa articulação.

Uma colocação mais exata da questão é-nos dada por Jean-Louis Gardies, precisamente numa reflexão sobre Hume. O filósofo francês toma como ponto de partida o entendimento da separação inultrapassável entre o factual e o deôntico, o descritivo e o normativo, o ser e o dever ser, que colhe no Wittgenstein do Tractatus (Gardies 1987: 10-11), a que associa a observação de von Wright de que é um dado da experiência comum o recurso a proposições mistas, proposições em parte enunciativas e em parte normativas (idem: 14), as quais potencialmente asseguram a transição entre proposições puramente teóricas e proposições estritamente normativas (ibidem: 26). Só que a existência de tais expressões não assegura, só por si, a resolução do problema da irredutibilidade entre existir ser e dever ser, pois para se poder ultrapassar o fosso que os separa seria necessário poder deduzir-se o puramente enunciativo do puramente normativo e vice-versa (ibidem: 27). Pode procurar-se resposta no recurso ao princípio normativo de possibilidade, de acordo com o qual o dever ser pressupõe o poder ser (ibidem: 31). Porém, para o nosso autor, numa proposição mista antepõe-se um antecedente normativo a um consequente enunciativo, logo estas proposições não permitem verdadeiramente a passagem do enunciativo para o normativo (ibidem: 46). A conclusão a tirar é a de que passagem do existir ser para o dever ser não está, nem pode estar, na linha aberta por Hume de um tratamento sintáxico dessa articulação. A abordagem sintáxica não nos permite fundamentar as normas (logo, os deveres) nos factos, da mesma maneira que não se encontra esse fundamento na convenção, na vontade ou no sentimento (ibidem: 114). Também não há um critério lógico ou linguístico que permita, sem margem para dúvida, distinguir factos brutos de factos institucionais e sujeitá-los a regras lógicas distintas (ibidem: 115). Resta-nos apenas a admissão do princípio normativo de possibilidade como ponto de convergência entre existir ser e dever ser (idem: 117) e fica por explorar uma via para a resposta assente numa abordagem semântica (ibidem: 46) que o nosso autor acaba por não concretizar.

Uma alternativa para a conciliação entre existir ser e dever ser, na perspetiva do direito, assenta igualmente na ideia de proposições mistas mas pensadas em termos diversos dos de Gardies. Falzea identifica o antecedente da expressão normativa prática em que se funda o dever, quer com o facto jurídico, quer com o facto sensível pré ou a-jurídico, pelo que o antecedente é simultaneamente enunciativo e normativo. Diversamente, no consequente é delimitado como efeito um facto específica- e exclusivamente jurídico, sem correspondente material apreensível pelos sentidos (Falzea 1965: 433). Além disso, o facto jurídico do consequente normativo é estruturalmente equivalente ao facto jurídico do antecedente (ibidem: 473). Deste ponto de vista, a articulação na relação hipotética jurídica (na norma) entre o (existir) ser, o plano dos factos (idem: 440), e o dever (ser), o plano dos valores (ibidem), opera-se no antecedente e percorre um processo que começa com a comprovação do facto não jurídico, a que sucede a qualificação jurídica de tal facto não jurídico com base no antecedente da norma e se conclui com a atribuição de um dado valor jurídico ao facto nos termos do consequente (ibidem: 473), atribuição de valor permitida porque, como referido, o facto jurídico do consequente é estruturalmente equivalente ao facto jurídico do antecedente. Há aqui uma articulação parcial entre facto não jurídico e facto jurídico, parcial porque apenas abrange a factualidade antecedente, simultaneamente entendida como pré-jurídica/a-jurídica e jurídica, ao passo que o efeito expresso no consequente é estritamente jurídico. O problema está, neste caso, em que não é adequadamente explicada a duplicação no antecedente de uma dimensão enunciativa e de uma dimensão normativa, nem é adequadamente estabelecida a articulação entre ambas.

O que nos leva de regresso a Kant. Vimos que a asserção do dever ser pressupõe a expressão de um poder fazer, de um possível operar no mundo da natureza. O juízo prático pressupõe e incorpora um juízo teórico, não há apetição, não há vontade, que não se exerça sobre fenómenos teoricamente enquadráveis. O juízo prático é assim um juízo exponível (Geach 1965) num juízo teórico e num juízo moral-prático em sentido estrito. Neste sentido Kant acolhe, sem margem para dúvidas, o princípio normativo de possibilidade (Kant 1986: 79; AA 05: 65). Simplesmente, não é qualquer juízo teórico que é relevante para a prática, o juízo teórico que subjaz ao juízo prático é elaborado de acordo com as regras de construção formal de juízos teóricos, com duas restrições: quanto à sua sintaxe, tem de estar aqui em causa um juízo causal (categoria teórica da relação); e quanto à sua semântica, tem de se tratar de um juízo de possibilidade (categoria teórica da modalidade). Decorre do exposto que a asserção de um dever ser (num sentido amplo de dever que incorpora todas as modalidades deônticas), tem de incidir sobre um poder fazer (ser), não sobre um existir fazer (ser) e menos ainda sobre um ter de fazer (ser). O juízo prático expande a compreensão desse poder fazer (ser) sobrepondo à configuração teórica do ser uma sua reelaboração prática traduzida num juízo expresso com a sintaxe das categorias práticas de quantidade, qualidade e relação, e a que é atribuído um valor semântico lógico-prático, uma modalidade prática. Esta modalização visa a necessitação prática de uma das alternativas inerentes à hipoteticidade teórica: se, do ponto de vista teórico, o viajante tanto pode pagar o bilhete como pode não pagar o bilhete, do ponto de vista prático deve pagar o bilhete, logo é contrário ao dever não pagar o bilhete.

A questão não fica por aqui, o juízo prático não se limita a introduzir uma semântica prática a par da semântica teórica. O juízo prático configura o ser em termos estritamente práticos, tipifica-o à luz de conceitos práticos articulados numa expressão regida pela sintaxe fornecida pelas categorias práticas. O juízo prático institui assim um dado estado de coisas, uma certa configuração do ser, no domínio da liberdade, quer dizer, no reino dos fins. A inteleção do ser desdobra-se então numa dupla inteleção como objeto da natureza e como objecto do reino dos fins. O bilhete para a viagem no Alfa Pendular é uma folha de papel onde estão pintados certos padrões percetíveis pela vista ou pelo tato, mas é também um título representativo de um complexo de direitos e deveres recíprocos entre o viajante e o transportador. Tendencialmente coerentes, estas duas inteleções podem mover-se em sentidos diferentes. O princípio normativo de possibilidade assegura que a conformação do reino dos fins não ultrapassa os limites do reino da natureza, que o dever se atém ao naturalmente possível e não se perde na imposição de fins incidentes sobre configurações do ser naturalmente impossíveis nem a redundância da imposição de fins incidentes sobre configurações do ser naturalmente necessárias, o que seria uma falha no exercício da faculdade de julgar prática (Kant 1986: 82; AA 05: 67-68). Mas esse princípio não converte o juízo teórico subjacente ao juízo prático no esquema deste, quer dizer, o que é no domínio da liberdade não se reduz ao que é no domínio da natureza, a destruição física do bilhete não elimina os deveres e direitos nele expressos. No sentido inverso e pela mesma ordem de ideias, o juízo prático tipifica o estado no domínio da natureza a realizar pelo agente com a sua ação, sendo esse, de entre os estados possíveis, o estado devido por ser aquele que permite conciliar a liberdade dos participantes no reino dos fins e contribui para o seu aperfeiçoamento e felicidade. O exercício da vontade pela faculdade de juízo prática determina os estados do ser que a ação do agente moral é constrangida a tornar reais ou, mais exatamente, existentes (Kant 1986: 105; AA 05: 89).

Bibliografia

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Outros artigos

Consciência moral; Deontologia; Interesse; Lei; Lógica deôntica; Norma; Utilitarismo


Como citar este artigo

Mascarenhas, S. “Dever”. Dicionário de Filosofia Moral e Política (2018), 2.ª série, coord. António Marques e André Santos Campos. Lisboa: Instituto de Filosofia da Nova, URL: <http://www.dicionariofmp-ifilnova.pt/dever>.


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DOI: http://doi.org/10.34619/zq92-qq83


Publicado em: 8 de Outubro de 2018


Sérgio Mascarenhas

CEDIS, Universidade Nova de Lisboa

<smascrns@gmail.com>